A Roberto Pontes
Que pode o
poeta
senão dispor-se
a despir suas substâncias
ao Poema?
O poeta fala carne
engole chumbo
planta seda
O poeta sabe à mister
e a mistério
O poeta sonha
um metro
de essência
em seu limiar
risca a prata
cala o medo
tange a bala
de sua arma
letal
às vezes dedica-se
ao fato
outras (detido por todos os
sentidos que o permeiam)
prende o gesto
fabrica a mica
gera o fogo.
Daniel Óliver
PEQUENA ANÁLISE: O poema é feito da mesma matéria de que é feito o ser do poeta. Esta, a grande síntese deste poema forte, cheio de metáforas bem ao estilo de Gullar. O poeta aqui aparece como um grande mago, ou melhor, um grande artesão, que tece os seus versos, a partir do concreto, do vivido, por isso, imagens tão fortes como o chumbo, a prata (coisas pesadas, como a vida pode ser). Mas é destas matérias que ele, na observação da vida, "prende o gesto", molda-o e "fabrica a mica" para então, na beleza e na simplicidade do poema, "gera[r] o fogo". Creio estar nesse último elemento, a maior das simbologias deste poema: o fogo é dos mais primitivos elementos que o homem conhece, ele é simples porque é apenas chama, mas a chama é ardente e pode queimar, como pode purificar, eis a função do poema!
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